Nos últimos 4 meses o Brasil ouviu pelo rádio e televisão uma voz desconhecida que convidou o eleitor para votar limpo e pela sua cidade. Nunca antes na história deste país uma propaganda foi tão repetida como a que o TSE fez para exaltar o ficha limpa, como se ficha limpa fosse algo do qual devêssemos nos orgulhar, uma virtude e não um dever de todo cidadão. Foram milhões de repetições que tentaram mostrar a Lei da ficha limpa como um marco histórico, uma conquista do povo e o principal motivo para comparecer às urnas no domingo. Ora, se para ser funcionário publico de qualquer escalão, é necessário, como pré-requisito, ter ficha limpa, por que para ser político vira uma virtude? O TSE deu valor maior a algo que tem valor relativo, já que trata-se de um dever ter ficha limpa.
O “tribunal da democracia”, como se auto intitula o TSE, deveria, mais do que exigir ficha limpa, é estabelecer regras rígidas para uma candidatura a cargo político, pré-selecionando candidatos que apresentem condições mínimas que lhes permitam disputar um pleito eleitoral e fazer bom uso do cargo que lhe será conferido pelo voto. Isso sim mitigaria os riscos de erro por parte do eleitor, que tem pouco ou nenhum instrumental para medir a capacidade de um candidato. Se não bastasse, o eleitor fica exposto aos recursos do marketing político, que regra geral destorce a realidade em benefício dos candidatos, tendo o voto e não o resultado do trabalho do político como fim. Aliás, a vitória de eleições no Brasil tem sido muito mais do marketing, da propaganda política, do montante que cada candidato tem para gastar, do que propriamente dos conteúdos e história de realizações dos candidatos. Ganha quem gasta mais.
O modelo atual contribui para os erros na hora da decisão. Erros cuja essência da democracia, a maioria dos eleitores corre o risco de cometer por questão de formação e limitações as vezes até mesmo intelectual. Isso por que na democracia é permitido a “qualquer um”, o que não deveria ser para qualquer um. Em tese, não se exige qualificações específicas para um candidato, apenas que ele saiba ler e escrever. O que, diga-se de passagem, é muito pouco para um indivíduo que vai governar, criar leis e administrar cidades complexas como as que conhecemos e vivemos. Assim fica como critério de escolha a popularidade. Vale lembrar que o tapinha nas costas, o discurso politicamente correto, a propaganda mostrando uma cidade perfeita que só existe na TV, o carisma e os favores que um candidato presta para seus eleitores, não estão sendo suficiente para resolver o drama do conjunto da sociedade.
Para promover a boa saúde pública, mobilidade eficiente, habitação para todos, segurança de qualidade, educação que liberta, meio ambiente etc, exige-se competência comprovada e não apenas popularidade. E não é por acaso que o noticiário está farto de episódios que comprovam a tese de que a maioria dos políticos estão lá para se locupletarem, querendo apenas uma boquinha. A exceções existem, mas infelizmente são raras. Com efeito, mais importante do que uma ficha limpa, é buscar mecanismos que avaliem as motivações e a capacidade dos candidatos para o exercício da política. Seu histórico e sua trajetória de vida. O modelo eleitoral brasileiro, ao contrário do que o TSE tenta mostrar, dá sinais de falência e regressão, e não de evolução, uma vez que não consegue mais barrar a entrada de cidadãos que deveriam ficar longe da política.
O TSE admite fraudes, compra e venda de votos, reconhece suas limitações, mas transfere para o eleitor a tarefa de pesquisar a vida pregressa do candidato, quando deveria ele mesmo cuidar disso através de instrumentos que a Lei lhe faculta. Quando o instrumental não for suficientes, os Doutores da Lei devem propor ao Legislativo Federal mecanismos capazes de impedir a entrada de “fichas limpa” mal intencionados através de novas Leis. Com efeito, ao povo é dada uma responsabilidade maior do que a sua capacidade, tanto intelectual, como legal para medir as motivações e a competência de um candidato a cargo político. Neste sentido, pior do que não votar, é votar em indivíduos desqualificados, dando a eles legitimidade para usar a influencia e muitas vezes o dinheiro publico e benefício próprio ou de partidos sem compromisso com a sociedade. O que por si só, torna o prejuízo muito maior.
José Aparecido Ribeiro
Administrador em Belo Horizonte
Presidente do Conselho Empresarial de Política Urbana
ACMinas – Associação Comercial de Minas
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