Cine Candelária, que por 4 décadas funcionou na Praça Raul Soares, ganha projeto de revitalização

O jovem acadêmico de arquitetura Gabriel Silveira Radicchi não era nascido quando o Candelária fechou suas portas em 1995, mas se interessou e fez um belo projeto para revitalização do cinema

Em 12 de dezembro de 1897, cinco dias antes do prazo final estabelecido por Lei, Belo Horizonte foi oficialmente instalada como a nova capital do Estado de Minas Gerais. Não se passou muito tempo para que o primeiro cinema da cidade aparecesse. Foi no dia 2 de julho de 1898, pelas mãos do comerciante Oscar Trompowski que deu entrada na Prefeitura a um requerimento para que William Mardock, exibidor, tivesse autorização para apresentar ao público da recém inaugurada capital o aparelho de Thomas Edson, denominado Cinematógrafo.

A sessão aconteceu oito dias após, em uma casa da rua Goiás, de propriedade do Dr. Hermínio Alves. Haviam passados três anos do início de uma história de glórias que começou com a primeira exibição de um filme de curta duração no Salão Grand Café, em Paris, no dia 8 de dezembro de 1895. Nesta data, os Irmãos Lumière fizeram uma apresentação pública dos produtos de seu invento ao qual chamaram de Cinematógrafo.

O Cine Candelária, na Praça Raul Soares, chegou 54 anos depois da estreia da sétima arte em BH e foi inaugurado no dia 11 de dezembro de 1952 sendo considerado, na ocasião, como um dos mais confortáveis e maiores cinemas da capital. Em seus últimos anos antes de fechar (1995) exibia apenas filmes para maiores de 18 anos, os famosos “mela cueca”, entre eles As Brasileirinhas com Gretchen e Rita Cadilac. Começava ai a sua decadência. Em 2004 um incêndio o destruiu e, desde então, funciona no seu endereço um estacionamento em ruinas, cujas paredes estão sendo mantidas de pé por estacas.

A matéria é um misto de esperança e nostalgia, para os que apreciam o cinema de rua na capital mineira e que, em sua maioria, já pertencem à “juventude prateada” com mais de meio século de estrada. O Candelária faz parte da história de BH desde 1952 e foi palco de muitas exibições que marcaram a vida de toda uma geração. Merecia outro fim que não fosse um estacionamento em ruinas, a exemplo das revitalizações do Cine Brasil e do Art-Palácio, o maior cinema de BH.

Foto: Acadêmico de Arquitetura Gabriel Silveira Radicchi

A proposta do acadêmico Gabriel Silveira Radicchi (24) é de revitalização do Cine Candelária. Ele aproveitou o fato da edificação ter sido tombado em 2009 por sua importância histórica e cultural pela FMC – Fundação Municipal de Cultura. Sua Localização privilegiada na Praça Raul Soares, nº 315, não pode ser reduzida à escombros que colocam em risco a vida de transeuntes que por ali circulam. Hoje o que sobrou do Candelária pode vir abaixo a qualquer momento, foi apenas uma parede do que um dia foi a fachada de um dos melhores cinemas de Belo Horizonte.

Gabriel não era nascido quando o Candelária fechou suas portas em 1995, mas se interessou pela história do cinema e escolheu como tema do seu trabalho de conclusão do curso de arquitetura a revitalização do prédio, mantendo sua originalidade e a proposta de continuar sendo um cinema que exibe filmes. Para enriquecer o trabalho, o acadêmico incluiu no projeto, a construção de um amplo espaço multiuso que dialoga com o público que continua valorizando o cinema de rua. Ele conversou com o blog e explica quais foram as motivações para revitalizar o Candelária.

O projeto faz parte da matéria de “Intervenção do Patrimônio Edificado”, necessária para conclusão do curso da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Instituto de Ciências Sociais da PUC Minas, e que ensina os futuros arquitetos a desenvolverem projetos de preservação, restauração ou revitalização de alguma edificação histórica. O prédio do Candelária se enquadra na categoria de patrimônio físico. Após acesso à planta original do prédio, e levantamento feito 3 anos depois incêndio, em 2006, realizado pela prefeitura, quando o prédio já estava em ruinas, o acadêmico juntamente com o coordenador dos trabalhos (professor Gustavo Pimenta de Pádua) fizeram visitas ao local e estabeleceram as metas de desenvolvimento do projeto.

A partir das visitas, deu-se início a um registro fotográfico que permite, baseados no projeto original cujos registros estão microfilmados, reconstruir o prédio bem próximo do que ele era. Gabriel usou para o seu trabalho acesso a um dossiê feito pelos Arquitetos e professores Françoise Jean de O. Souza e Karime Gonçalves Cajazeiro. Neste dossiê foi possível encontrar informações históricas e do projeto arquitetônico, com riqueza de detalhes de todos os processos de alterações que o prédio sofreu ao longo dos seus 44 anos de vida, todas úteis para a construção do projeto de revitalização.

O documento ao qual Gabriel teve acesso, é um resumo histórico que conta a trajetória do Candelária incluindo a programação em seus vários períodos, de cinema popular a endereço de exibição de pornochanchadas, tudo isso com fotografias e registros históricos que resumem como foram os anos de glória e decadência, e a própria existência do cinema entre 1952 até 1995, e posteriormente ao incêndio em 2004 com os marcos das mudanças que o local sofreu.

O projeto, Gabriel chama atenção, não é uma reconstrução e nem tampouco uma restauração, isso por que o bem não pode ser reconstruído como era antes. “O projeto é uma revitalização que não pode encostar na fachada, tendo em vista que trata-se de uma estrutura arruinada. Primeiro fazemos um reforço estrutural do que restou, e que nos deixa triste de ver o estado que se encontra, pois foi muito pouco, e depois edificar o restante tendo como base o projeto e os registros que conseguimos. São várias propostas para a edificação, incluindo prédio comercial, escola de música, coworking, centro de memória, todas aproveitando as entradas pela rua Goitacazes e outra pela Praça Raul Soares. Eu escolhi o cinema por que existe um movimento de resgate dos cinemas de rua dentro do contexto moderno e de revitalização do Centro histórico de BH”, relata o acadêmico.

Ele lembra ainda que no entorno existem vários espaços culturais com a presença popular e cita o exemplo do Mercado Novo, do Viaduto Santa Tereza, todos conversando com o resgate do cinema que por 44 anos fez parte do cotidiano da capital: “Quem frequentou o centro de Belo Horizonte durante as 4 décadas de existência do cinema sabe o quanto ele foi importante para a vida cultural do belo-horizontino. Além disso não podemos perder de vista que o prédio foi um ícone da estilo ArtDéco”, destaca.

Por fim o acadêmico destaca: “Existe a demanda para um cinema naquela região da cidade que está próximo ao Mercado Central, é passagem de veículos e transporte coletivo de várias partes que atravessam o centro vindos de dezenas de bairros e até cidades da RMBH, uma vitrine natural. Além disso é um espaço para os frequentadores ligados à arte, ao cinema e ao movimento cool, que gostam de filmes preto e branco, exibições especiais e tudo isso resgatando a proposta inicial do cinema e sua fachada que guarda até hoje o nome. Meu projeto contempla 3 salas de cinema grandes e multiuso; um espaço de memória da cinematografia brasileira e um bar conectado com o cinema com circulação livre para os espaços, assim resguardamos e homenageamos a memória dos arquitetos, engenheiros e operários que construíram o Candelária”, encerra.

Foto: Reprodução Pinterest – Fachada atual do Cine Candelária

O projeto original do cinema é do Arquiteto Italiano Nicola Santolia no estilo ArtDéco, viveu seu apogeu entre 1950 e 1970. Fechou as portas em 1995, quando já exibia apenas filmes pornográficos. As circunstâncias do incêndio que destruiu o Canelaria em 2024 até hoje não foram esclarecidas. Um projeto com a definição do novo uso do espaço e com detalhes da revitalização ainda não tinha sido apresentado, embora existam várias propostas, dentre elas a do acadêmico Gabriel Silveira Radicchi, que mais se assemelha ao original de 1952.

  • A exceção da ultima foto que retrata a fachada atual do Candelária, as projeções fazem parte do trabalho do Acadêmico Gabriel Silveira Radicchi.

José Aparecido Ribeiro é jornalista

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By zeaparecido

José Aparecido Ribeiro é Jornalista, Bacharel em Turismo, Licenciado em Filosofia e MBA em Marketing - Pós Graduado em Gestão de Recurso de Defesa

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